Saturday, January 20, 2007

Os Diferentes – Artur da Távola (Crônica Mevitevendo)

Diferentes não é quem o pretenda ser. Este é um imitador do que ainda não foi imitado, nunca um ser diferente.
Diferente é quem foi dotado de alguns mais e de alguns menos em hora, momento e lugar errado. Para os outros. Que riem de inveja de não serem assim. E de medo de não agüentarem, caso um dia venham a ser. O diferente é um ser sempre mais próximo da perfeição.
O diferente nunca é um chato. Mas é sempre confundido com ele por pessoas menos sensíveis e avisadas. Suponho encontrar um chato onde está um diferente, talentos são rechaçados; vitórias são adiadas; esperanças são mortas.
Um diferente medroso, este sim acaba trasnformando-se num chato. Chato é um diferente que não vingou.
Os diferentes muito inteligentes entendem pó que os outros não o entendem. Os diferentes raivosos acabam tendo razão sozinho, contra o mundo inteiro. Diferente que se preza entende o porquê de quem o agride.
O diferente paga sempre o preço de estar – mesmo sem o querer - alterando algo, ameaçando rebanhos, carneiros e pastores. O diferente agüenta no lombo a ira do irremediavelmente igual; a inveja do comum, o ódio do mediano. O verdadeiro diferente sabe que nunca tem razão mas que sempre está certo.
O diferente começa a sofrer cedo, desde o primário, onde todos os demais de mãos dadas, e até mesmo alguns professores por omissão (principalmente os mais grossos), se unem para transformar o que é peculiaridade e potencial, em aleijão e caricatura. O que é percepção aguçada em “- puxa, fulano, como você é complicado”. O que é o embrião de um estilo próprio em “ – você não está vendo como é que todo mundo faz?”.
O diferente carrega desde cedo apelidos e marcações nos quais acaba transformando-se. Só os diferentes mais fortes do que o mundo se transformaram (e se transformam) nos seus grandes modificadores.
Diferente é o que vê mais longe do que o consenso. O que sentes antes mesmo dos demais começarem a perceber. Diferente é o que se emociona enquanto todos em torno agridem e gargalham.
Diferente é o que: fica doendo onde a alegria impera. Aceita empregos que ninguém supõe. Perde horas em coisas que só ele sabe importantes. Engorda onde não deve. Diz sempre na hora de calar. Cala sempre nas horas erradas. Não desiste de lutar pela harmonia. Fala de amor no meio de guerra. Deixa o adversário fazer o gol porque gosta mais de jogar do que de ganhar.
Diferente é o que aprendeu a superar o riso, o deboche, o escárnio e a consciência dolorosa de que a média é má porque é igual.
Os diferentes ao estão: enfermos; paralíticos; machucados; engordados; magros demais; bonitos de mais; inteligentes em excesso; bons demais para aquele cargo; excepcionais; narigudos; barrigudos; joelhudos; de pé grande; feios; de roupas erradas; cheios de espinha; de mumunha; de malícia ou de baba; os diferentes aí estão, doendo e doendo, mas procurando ser, conseguindo ser, sendo muito mais.
A alma dos diferentes é feita de uma luz além. A estrela dos diferentes tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos que forem capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão os maiores tesouros da ternura humana. De que só os diferentes são capazes.
Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suporta-lo depois.

1 comment:

Anonymous said...

Cair em seu Blogger sem querer, sem querer fui levado a ler, sem querer pára, fui levado a continuar, sem querer me emocionar, emocionei-me, sem querer comentar, comentei!

Parabéns, o Blogger está ótimo e a crônica é ótima!